9 de novembro de 2004

A novela de Deus

Por volta dos meus 8 anos de idade, raramente (para não dizer nunca) desesperava por desgostos de amor.
Não riam!!
É claro que uma criança de 8 anos (principalmente, uma menina) tem desgostos de amor!
O que vos estou a dizer é que não os encarava como uma tragédia.
O que acontecia é que acreditava piamente serem apenas percalços, pequenas contrariedades, obstáculos a vencer.
Porque estava plenamente convencida que, "no fim, tudo acabaria bem".
Na minha imaginação infantil, éramos assim como que a novela particular de Deus.
Uma série de peripécias que O entretinham, com recompensas para os 'bons' e castigos para os 'maus'.
E, sendo assim, à noite sonhava que eu e o meu 'príncipe' acabaríamos por ficar juntos, felizes para sempre.

O que será que me aconteceu, entretanto?
Cresci, sem dúvida!
Mas entristece-me perceber que perdi completamente o romantismo.
Actualmente (ou não fosse eu a pisciana assumida que já vos confessei ser) pareço encarnar exactamente a postura oposta.
Frieza e racionalidade, por vezes, em excesso.
Análise constante dos factos e cinismo.
Descrença e desconfiança ao ouvir histórias de grandes paixões ("até quando durarão?", "serão sinceras?").

Todos os obstáculos me parecem agora intransponíveis.
O objectivo da perfeição completamente inatingível.
Finais felizes?? Não acredito!
Estou desencantada...
E parece que não sou a única. Senão, vejam os comentários ao post "2ª Fornada"...
"(...) Pessoalmente considero que o "negócio" da alma gémea não passa de uma ficção alimentada pelo nosso imaginário (...)"
"(...) sim, acho que esta coisa de idades semelhantes para realizações semelhantes tem a ver com o processo e ritmo da vida, de um ponto de vista biológico e sociológico também (...)"

O que me fez pensar...
Custa-me a engolir que aquilo de que tantas músicas falam, que tantos livros contam, que tantos poemas descrevem, seja apenas produto da imaginação do Homem.
Que aquilo que tantos anseiam, mas que só acontece a alguns mais afortunados seja, afinal, mentira desses poucos.
Que quem encontra 'alguém' já no entardecer da vida, boicotando todos os ciclos biológicos e sociológicos, o faça por algo diferente de amor.

Será então...?
... que o meu romantismo não morreu?
... que apenas o exprimo de maneira diferente, hoje em dia?
... que o que faço actualmente é apenas não me vender a algo menor do que sonhei para mim?
... que esta é apenas a minha forma de não abandonar os sonhos românticos da minha infância?
... que esta atitude é apenas a recusa teimosa em contentar-me?

Apercebi-me que, afinal, não acredito no 'negócio' ou na 'ficção' do Amor.
No fundo, no fundo, eu sei que a 'alma gémea' existe.
E sei que, se e quando a encontrar, serei feliz para sempre!